
A largada oficial de uma campanha que já começou!
Nuno Vasconcellos
Começou ontem, dia 20 de julho, e vai até o próximo dia 5 de agosto o prazo para que os partidos políticos oficializem as chapas com as quais disputarão as eleições municipais
deste ano. Cumprida essa formalidade, começa a descrição de um novo prazo, para que os postulantes às prefeituras e às câmaras de vereadores dos 5.570 municípios brasileiros registrem suas candidaturas na Justiça Eleitoral.
Só depois do dia 16 de agosto, data marcada para o início da campanha no calendário eleitoral, é que terá início oficialmente a disputa pela preferência do sufragista.
Oficialmente. Esse advérbio faz toda diferença. A campanha para os cargos municipais começará “oficialmente” daqui a duas semanas, mas, na prática, ela já está nas ruas desde o dia 1º de janeiro de 2021. Explica-se: na tradição democrática, campanhas eleitorais são os momentos em que os postulantes a cargos públicos abordam os eleitores para convencê-los de que suas propostas são melhores do que as dos adversários. Os que são mais eficazes nesse trabalho, ganham as eleições e o recta de governar.
No Brasil,
acontece o contrário. Os políticos governam para lucrar eleições. Assim porquê as Escolas de Samba começam a se preparar para o próximo carnaval já na Quarta-Feira de Cinzas, é provável proferir que os políticos brasileiros nem se dão ao trabalho de descer do varanda. Eles começam a pensar na próxima eleição logo que a Justiça Eleitoral proclama o resultado do pleito que acabou de ocorrer. Os eleitos já assumem pensando no pleito seguinte. E, em nome desse propósito, os maiores absurdos são cometidos. Tudo é permitido, até mesmo fazer, no manobra do procuração, exatamente o oposto daquilo que foi prometido ao sufragista durante a campanha.
Tem sido assim desde que a possibilidade de reeleição levou os políticos a estarem o tempo todo com os olhos voltados exclusivamente para os benefícios eleitorais que suas decisões podem render. Em nome desse princípio, ainda que tenham sido eleitos com a promessa, por exemplo, de evitar gastos desnecessários do verba público e de tratar o tributário com reverência, os políticos são os primeiros a pôr o pé no acelerador e não fazer economias quando assumem o procuração. Por mais evidente que seja a urgência de medidas de austeridade, são raros os que têm coragem e disposição para tomar qualquer decisão que possa vir a prejudicar os interesses das corporações mais poderosas e barulhentas que vivem à custa do Estado.
PIRÂMIDE POLÍTICA
— Isso, simples, é uma generalização — e, porquê toda regra, esta tem suas exceções. Outro ponto a observar: isso não é uma exclusividade do município do Rio de Janeiro. É logo que as coisas acontecem em Brasília, em todas as 27 unidades da Federação e na enorme maioria dos municípios do país. Seja porquê for, o trajo é que no Rio, porquê de resto em qualquer outro municípiodo estado e do país, a campanha para as eleições municipais começou muito antes de ter sido formalmente autorizada pela Justiça Eleitoral.
Só quem vive no mundo da lua não sabe que o prefeito Eduardo Paes (PSD) é candidato à reeleição e lidera as pesquisas de intenção de voto, enquanto o deputado e professor Tarcísio Motta (PSOL) será um de seus adversários. Também é público e evidente que o ex-diretor da Escritório Brasileira de Informações (ABIN), Alexandre Ramagem (PL)
medirá força com eles nas urnas.
Outros nomes já estão definidos e nenhuma pessoa que acompanhe a política com um mínimo de atenção tem o recta de alegar que não sabe quem disputará o comando da prefeitura do Rio para os próximos quatro anos. Mas há um outro ponto, tão importante quanto esse, que nem sempre é mencionado quando se fala nas eleições que estão por vir. Trata-se do Legislativo municipal.
Isso mesmo. Também estarão em disputa as vagas de vereadores e esse função, embora seja visto por muitos porquê a base da pirâmide política brasileira, confere a seu ocupante uma influência considerável no processo de tomada de decisões. Quem reparar recta, notará que o vereador tem mais poder do que parece. E dispõe de uma possibilidade de interferir na vida da população muito mais efetiva do que a de um deputado estadual ou de um deputado federalista.
É bom deixar simples: ninguém está dizendo que vereador é mais importante do que deputado. O que está sendo dito é que, sobretudo numa cidade porquê o Rio, o função de vereador proporciona a seu detentor uma possibilidade considerável de trabalhar pela sociedade. Suas atribuições incluem o poder de tomar decisões que levem à melhora ou a piora do transporte público. E que podem ter reflexos na qualidade dos serviços de iluminação das ruas, na qualidade da pavimentação, na melhoria das posturas urbanas, na melhoria dos serviços de coleta de resíduos sólidos e limpeza das ruas e em mais um monte de tarefas que estão a função da gestão municipale interferem diretamentena qualidade de vida da população.
Nenhuma mudança nessas políticas acontece sem passar pela Câmara Municipal.
Por essa razão, o voto oferecido ao candidato a vereador tem tanta influência quando o voto para prefeito. Essa já seria uma razão suficiente para que os partidos assumissem a obrigação de agir com muito mais critério do que normalmente agem na hora de escolher os nomes que oferecem à escolha do sufragista.
PESO E COMPLEXIDADE
— A verdade, porém, é que critério é alguma coisa que parece não viver nessa hora e a escolha dos nomes que disputam é feita muito mais com base na capacidade de atrair votos do que na conhecimento para formular políticas que produzam melhorias para a população. Para deixar muito simples o que se pretende proferir: na hora de formar uma placa, comunicadores ou influenciadores digitais têm preferência diante de pessoas mais muito preparadas para mourejar com as políticas públicas sob responsabilidade do função.
Uma prova de que os critérios para a escolha dos candidatos são extremamente flexíveis é a quantidade enorme de nomes que disputam o função de vereador. A sentimento que se tem é a de que há candidato demais para as vagas disponíveis. Nas eleições passadas, em 2020, 1788 candidatos disputaram os 51 assentos no plenário do Palácio Pedro Ernesto — que abriga o Poder Legislativo do município do Rio de Janeiro. A previsão é de que o número oriente ano seja ainda maior.
Cá é bom invocar a atenção para um ponto importante: a Câmara reflete o peso e a complicação do município e, a principiar pela quantidade de vagas que oferece, a do Rio é uma das mais destacadas do Brasil. Para se ter uma teoria de seu destaque, somente seis das 27 Assembleias Legislativas existentes no país têm mais cadeiras do que as 51 que são preenchidas a cada quatro anos no legislativo municipal carioca. São elas a de São Paulo (com 94 deputados estaduais), de Minas Gerais (77), do próprio estado do Rio (70), da Bahia (63), de Rio Grande do Sul (55) e do Paraná (54). Todos os outros 20 estados e mais o Província Federalista têm em suas Assembleias Legislativas
menos representantes do que a Câmara do Rio.
Os partidos, portanto, deveriam assumir a obrigação de facilitar o trabalho do sufragista, oferecendo a eles uma placa formada por candidatos pré-selecionados e em exigência de enfrentar os desafios do função que pleiteiam. Se isso acontecesse, os nomes escolhidos pelo sufragista seriam mais capacitados para dialogar com o próximo prefeito — seja ele Paes, Motta, Ramagem ou qualquer outro — com vistas à implementação das políticas públicas propostas durante a campanha. Na mesma medida, o prefeito será mais cobrado e fiscalizado com mais rigor caso se afaste dos interesses da sociedade.
PRESTAÇÃO DE CONTAS
— Esse é o ponto que interessa. Por mais ingênua que possa parecer qualquer teoria no sentido de melhorar a qualidade dos políticos brasílico, é obrigatório reconhecer que tudo deveria principiar pela seleção criteriosa, por secção dos partidos, dos nomes a serem levados à escolha do sufragista. Esse é um ponto que, por sinal, já foi defendido neste espaço mais uma vez.
É sempre importante voltar a esse ponto: para que os partidos brasileiros comecem a ser levados a sério pelo sufragista, eles precisam adotar princípios mais rígidos de relacionamento com seus filiados. Financiados, porquê são, pelo verba do povo, eles não têm o recta de continuar agindo porquê se não tivessem contas a prestar a quem quer que seja.
Assim porquê acontece com o sistema financeiro, onde os bancos são responsáveis pela conduta dos clientes e estão sujeitos a punições caso fique comprovado que o verba dos depósitos que recebem é proveniente de atividades ilícitas, os partidos deveriam responder por quaisquer ramal de conduta dos filiados que, em seu nome, se dirigem ao sufragista em procura de votos.
Todos sairiam ganhando se a legislação eleitoral obrigasse o partido a vasculhar a vida dos candidatos interessados em disputar uma eleição por sua legendae se corrobar que não pesa contra eles qualquer conduta desabonadora. Ou por outra,essas organizações deveriam ser as primeiras a fazer uma prestação de contas pormenorizada, que não permitisse sombra de incerteza em relação ao uso correto dos bilhões de reais que recebem para gastar em suas campanhas eleitorais.
Uma vez que diria John Lennon, “you may say I’m a dreamer”.
Ou, você pode proferir que eu sou um sonhador. Mas sempre insistirei em cobrar dos partidos políticos o princípio que valia para a mulher de César: não basta que sejam honestos; têm que parecer honestos. A veras, no entanto, tem sido inversa a essa.
Na semana passada, esta poste dedicou todoseu espaço à sátira da anistia que a Câmara dos Deputados concedeu aos partidos políticos que foram multados por descumprimento da lei eleitoral no que se refere às destinação de uma secção do fundo eleitoral para as campanhas de mulheres e de pessoas pretas. Na Proposta de Emenda Constitucional que concedeu o perdão, dois aspectos chamaram atenção.
O primeiro foi a desfaçatez com que os deputados tomaram, em favor próprio, uma medida que não conta com qualquer pedestal fora do mundo político e que os afasta ainda mais da sociedade que eles, por definição histórica, representam. O segundo é a amplitude do “espectro ideológico” (para usar uma sentença tão a palato dos políticos) dos deputados que tomaram a medida. Praticamente todos os partidos com representantes na morada participaram da farra. Gente que se desentende por qualquer motivo e nunca está do mesmo lado nas vontações, se uniu para se livrar de uma conta que, conforme um conta que não foi desmentido nem pela Justiça Eleitoral nem pelas próprias agremiações, ultrapassa os R$ 20 bilhões.
CACIQUES PARTIDÁRIOS
— É bom não se olvidar disso neste momento em que os partidos estão prestes a se lançar a uma novidade campanha. A PEC aprovada pela Câmara e encaminhada ao Senado (onde, certamente, será acolhida com todo carinho por Suas Excelências), ao contrário do que o sufragista gostaria que acontecesse, propõe regras ainda mais frouxas para a emprego dos recursos destinados às campanhas de pessoas pretas. A obrigação de destinar pelo menos 30% do Fundo Eleitoral às campanhas dos candidatos que preencham tal requisito permanece de pé. Mas o gasto, agora, será feito, conforme diz o texto da lei, “nas circunstâncias que melhor atendam aos interesses e estratégias partidárias”.
Não é preciso ser técnico em leis para saber que esse dispositivo só foi incluído na PEC para permitir que os caciques partidários continuem gastando os bilhões que tiram do tributário para se financiar da maneira que julgarem mais útil — sem ter que prestar contas a ninguém, nem mesmo à Justiça Eleitoral. Num momento em que artimanhas porquê essa maculam ainda mais a reputação dos partidos junto à sociedade, seria muito bom se o período de convenções partidárias fosse aproveitado para tentar melhorar sua imagem junto ao sufragista.
O mínimo que os partidos deveriam fazer agora, já na largada do processo eleitoral de 2024, seria assumir o compromisso de seguir ao pé da letra o que diz a legislação eleitoral e gastar os recursos que recebem do tributário de convénio o critério de repartição que decorre do sistema de cotas que eles mesmos propuseram anos detrás. Melhor ainda seria se todos os lados envolvidos na disputa se comprometessem, uma vez eleitos, a orientar seus mandatos de convénio com os compromissos que vierem a assumir em suas campanhas.
É preciso, finalmente, que os candidatos não se esqueçam de que os cargos em disputa neste momento são os deprefeito e vereador — e que não tem o menor cabimento trazer para o debate temas sem relação direta com os problemas que o Rio ou qualquer outro município do país tem para resolver. Isso mesmo. “Naturalizar” a campanha municipal, porquê defendem os setores interessados na prolongamento da polarização entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
e o ex-presidente Jair Bolsonaro,
não faz o menor sentido. Isso somente adia a solução dos problemas que há décadas afetam a vida do carioca.