Adílio, come entre as pernas

Foto: Arte / CR Flamengo

Adílio, um dos maiores da história do Flamengo, morreu aos 68 anos, nesta segunda-feira

Conheci Adílio em 1969. Por duas razões. A primeira: eu treinava entre os infanto-juvenis, na Gávea, pelo menos duas vezes por semana, onde ele era o craque maior. Desde logo era uma certeza que alcançaria os profissionais. A segunda: eu morava na Barão de Jaguaribe, em Ipanema, rua que a promessa atravessava à noitinha, nos dias de semana, vindo da Cruzada São Sebastião, para chegar ao Escola Manuel Bandeira, na Alberto de Campos, no qual estudava.

Quando passava por meu trecho, entre Maria Quitéria e Joana Angélica, era oriundo a troca de cumprimentos. Era freqüente, naquela quadra, distante da selvageria atual, as resenhas nas portas das casas e prédios, que permaneciam abertos 24 horas. Ipanema era quase um lugarejo do interno.

Enfrentei Adílio em algumas ocasiões. Além da idade – sou de 1955, ele de 1956 – tínhamos o paladar pela globo e – é evidente – pelo Flamengo. Havia uma evidente intervalo social, que o futebol costuma encurtar, mas que não congregava os mesmos desejos. O meu objetivo era jogar por diletantismo. O dele, fazer curso, o que conseguiu a partir de 1974, quando começou a ser relacionado para as partidas do time principal do Rubro-Preto.

O que faz lembrar dos seus primeiros passos no campo é a facilidade de domínio do epiderme e o drible pequeno, o que o levava efetivamente – léguas primeiro – a destacar-se dos demais. Não foi à toa que o menino-rei da geração 1955-56 do Flamengo – do qual príncipe era Júlio César, mais tarde Uri Geller – ganhou a notabilidade e os títulos mais importantes da história do clube.

Adílio, genial

Sua capacidade para o futebol era tão grande que não questionou treinadores nas poucas ocasiões que amargou o banco. Finalmente, sabia que estaria sempre entre as estrelas do time. Foi assim até depreender a idade que a cabeça ainda pensa, mas que os músculos não obedecem mais.

Adílio será sempre titular no quadro principal do Flamengo de todos os tempos. E os que conviveram com ele, uma vez que coadjuvantes ou admiradores, vão continuar condenando os técnicos que o deixaram de fora da Seleção Brasileira, por política ou pertinácia. Notadamente na Despensa de 1982, na Espanha, quando Telê Santana, o queridinho da prelo, preferiu deixá-lo à margem do torneio. Enfim, Telê perdeu o título por omissões e os erros cometidos naquela tarde calorenta do Sarriá.

Adílio chegará lá em cima uma vez que fez no time principal do Rubro-Preto há meio século, driblando a todos e jogando a globo nas redes dos adversários. Construindo resultados e levantando canecos. Assim, restará a nós, daqui, os teipes que permitam rever o que mostrou nos gramados. Recordaremos a sua humildade, antes e depois da glória, que lhe deu a capacidade para compreender que a vida talvez tenha sido, com ele, mais justa e festejada que um dia, na puerícia pobre e na luta do cotidiano, tenha sonhado.

E tenham, certeza: ainda vamos nos encontrar. Nem que seja para recordar aquele come entre as pernas que me fez desabar sentado, para gargalhada universal, no velho terreirão da Gávea. Até lá.

Siga nosso teor nas redes sociais: Twitter, Instagram e Facebook
.

Mostrar mais

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo
Fechar

Adblock detectado

Por favor, considere apoiar-nos, desativando o seu bloqueador de anúncios