Silvio Santos apoiou todos os presidentes e se dizia “office boy de luxo do governo“

Para o grande público, a face mais conhecida de Silvio Santos sempre foi a de apresentador famoso, com o microfone pendurado sobre a gravata, sorriso largo, gargalhada inconfundível e cabelo desempenado.

Possuidor do SBT e de outros tantos negócios, do setor agropecuário ao de construção, acumulava também uma trajetória de sucesso uma vez que empresário. Zero mal para quem começou a trabalhar cedo uma vez que camelô e, aos 14 anos, vendia nas ruas do Rio de Janeiro capas plásticas para documentos, uma vez que títulos de sufragista.

Além do trânsito nos meios artístico e empresarial, o apresentador que jogava verba dobrado em formato de avião para o auditório flertou com a política — algumas vezes nos bastidores e, outras tantas vezes, sob todos os holofotes.

Nessa seara, a empreitada mais conhecida foi, sem incerteza, sua candidatura à Presidência da República, em 1989, a primeira eleição direta desde a ditadura militar (1964-1985).

Em uma das propagandas de sua candidatura à era, Silvio Santos contou sua trajetória iniciada uma vez que ambulante e relacionou seus quatro pontos principais de preocupação: alimento, saúde, habitação e ensino.

Numa era em que os preços dos produtos variavam radicalmente para cima em um mesmo dia, Silvio Santos não esqueceu de prometer o combate inopino da inflação e a correção do salário dos trabalhadores.

“Vou me rodear de homens, sejam de que partidos forem, não importa, mas terão que ser homens que pensem uma vez que eu. Pretendo agir com sensatez, justiça e honestidade”, concluiu o empresário.

O Varão do Baú tinha recebido diversos convites, inclusive de Guilherme Afif Domingos, um dos presidenciáveis à era, para ser candidato a vice-presidente. Mas a verdade é que Silvio Santos estava sentenciado a ser protagonista e não coadjuvante.

O possuinte do SBT tentou trespassar candidato a presidente pelo PFL, partido ao qual era filiado, no lugar de Aureliano Chaves, que patinava nas pesquisas.

A iniciativa teve uma vez que um dos articuladores Edison Lobão, ex-senador que foi ministro de Minas e Força nos governos de Lula e Dilma Rousseff. A tentativa não prosperou. Com as portas fechadas no PFL, começou a procura por outra legenda.

Candidatura a presidente barrada no TSE

Silvio encontrou abrigo no nanico Partido Municipalista Brasiliano (PMB). Foi preciso, no entanto, uma daquelas manobras não raras na política. O logo candidato Armando Corrêa disse que Deus o inspirou em uma manhã a buscar um horizonte para a população e, por isso, renunciou em obséquio do apresentador. O novo vice passaria a ser Marcondes Gadelha.

Faltavam 15 dias para eleições, não havia tempo hábil para o nome do Varão do Baú nascer nas cédulas de papel. Quem quisesse votar em Silvio deveria assinalar o nome de Corrêa.

O apresentador gastou tempo de TV para explicar a confusão e apostou em um jingle que trazia seu número — o 26. A música de campanha era uma versão feita em cima da melodia de “Silvio Santos vem aí”, que embalava suas entradas no palco do “Programa Silvio Santos”.

Mesmo com o pouco tempo para o pleito, a ingressão do ex-ambulante embaralhou o xadrez eleitoral até ali jogado. Silvio Santos chegou a liderar as pesquisas, deixando Fernando Collor, do PRN, para trás.

Era esperado que o movimento que o levou ao topo da preferência nas sondagens não agradaria aos adversários.

Foram 18 os pedidos de impugnação que chegaram ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) questionando a legitimidade da novidade filiação partidária do apresentador, a repúdio do candidato substituído e a regularidade do registro do PMB.

O PRN, partido de Fernando Collor, era um dos mais ativos na tentativa de barrar o registro de candidatura do possuinte do SBT.

Em 9 de novembro de 1989, a prelo brasileira dividiu o espaço entre as notícias sobre a queda do Muro de Berlim naquele dia e a decisão dos ministros do TSE que, a seis dias da eleição, consideraram Silvio inelegível por ser concessionário de uma rede de televisão e por conta de uma irregularidade no registro do partido.

Candidato a prefeito

Mas o “vai-não-vai” da candidatura em 1989 não foi o único na vida do apresentador. No ano anterior, ele dissera que disputaria a Prefeitura de São Paulo, em princípio pelo PFL. Porquê showman que sempre foi, o possuinte do SBT fez o pregão em seu programa de TV, com boas doses de entretenimento e muitas pitadas de suspense até o final.

Ali, diante das “colegas de trabalho”, uma vez que se referia ao auditório constituído hegemonicamente por mulheres, ouviu no ar, primeiro, a opinião das filhas mais velhas, Cíntia e Silvia Abravanel. Ambas se posicionaram contra.

“Porquê animador, uma vez que Silvio Santos, você pode dar muito mais para o teu público do que uma vez que presidente da República ou prefeito”, opinou Cíntia, enquanto uma outra câmera do programa fechava a imagem em um Silvio Santos sério, que em muito contrastava com o varão de sorriso fácil que sempre foi. “Você não vai poder fazer tudo aquilo que o povo espera de você. Acho que isso vai destruir tudo aquilo que você conseguiu”, encerrou a filha do apresentador.

Àquela profundidade, o público e o meio político já estavam com os níveis de sofreguidão elevados para saber qual seria, enfim, a decisão de Silvio Santos. Mas, antes, todos também ouviriam a opinião da mulher do possuinte do SBT, Íris Abravanel.

“Acho que você não entende e não gosta de política. Em todos esses anos que a gente está vivendo junto, em toda essa nossa convívio, você nunca me demonstrou nenhum interesse político”, afirmou a mulher do apresentador por telefone.

Opiniões da família à segmento, Silvio Santos seguiu pelo lado contrário e, ao termo do programa, bateu o martelo: “Eu comecei dizendo ‘não votem em mim’, mas poderei manifestar ‘votem em mim’ porque eu não vou tapear vocês, porque eu vou ser o melhor prefeito que São Paulo já teve. Não tenham dúvidas. Logo, vamos para o finalmente: eu vou ser candidato a prefeito”, encerrou o apresentador e, àquela profundidade, aspirante a político.

No programa, o apresentador mostrou no ar recortes de jornais com pesquisas de intenção de voto em que seu nome aparecia no topo.

Ao colocar-se uma vez que candidato, Silvio Santos rompeu uma promessa que havia feito pouco antes: a de que nunca entraria para a política. Certeza que também fez reservadamente para Collor em 1989, antes de sentenciar disputar a Presidência.

De olho no impacto que uma candidatura do possuinte do SBT provocaria, Collor havia ido à mansão do empresário em São Paulo para, justamente, saber o posicionamento dele. Em 1988, Silvio Santos também havia refutado que viraria político — em público, diante das “colegas de trabalho”.

A verdade é que a candidatura do apresentador à Prefeitura de São Paulo enfrentava resistências dentro do próprio PFL. Tempos depois do pregão de sua decisão, Silvio Santos desistiu da corrida pela prefeitura em razão de um problema nas cordas vocais, que tratou, inclusive, nos Estados Unidos.

“Office boy” de luxo do governo

Uma inspiração do possuinte do SBT para ensaiar os passos na política teria sido Manuel de Nóbrega — importante radialista, humorista, empresário e também pai de Carlos Alberto de Nóbrega, apresentador do programa “A Terreiro é Nossa” (SBT). Manuel, que era uma espécie de tutor para Silvio, foi também deputado estadual em São Paulo e Constituinte em 1947.

Foi o pai de Carlos Alberto quem também incentivou Silvio a ter o seu próprio via de TV. No início da dez de 1970 o apresentador pleiteou a licença do via Excelsior e chegou a se reunir com o presidente Emílio Médici, embora a empreitada tenha ficado pelo caminho. Desde logo, o participador sempre fez carinhos ou se encontrou com os presidentes.

Em 1975, o governo federalista abriu licitação para o via 11 do Rio de Janeiro, e o apresentador resolveu participar da disputa. Silvio esteve no Palácio do Planalto e em reuniões com integrantes do governo. Tanta fala nos bastidores rendeu frutos. No final daquele ano, em pleno governo do general Ernesto Geisel, recebeu a licença. Em 14 de maio de 1976, a programação entrou no ar. Era o embrião do SBT, emissora lançada cinco anos depois.

O SBT entrou no ar pela primeira vez na manhã de 19 de agosto de 1981, com a transmissão da solenidade de assinatura da licença e um oração de Silvio Santos, ao vivo e a cores, no Ministério das Comunicações.

A geração da emissora foi provável porque o presidente João Figueiredo abriu, em 1980, uma licitação para licença de duas redes de televisão, e o empresário se empenhou em convencer o governo de que ele deveria comandar os canais. Para isso, encontrou-se com o superintendente da Lar Social e com o próprio presidente.

Logo depois de conseguir produzir o SBT, o ex-ambulante tirou do papel um quadro chamado “A Semana do Presidente”, para vulgarizar os feitos do governo. A iniciativa foi vista uma vez que um recurso para estimular o ufanismo e aumentar a popularidade do governo. Foram mais de 20 anos de programa, até o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

“Eu sou concessionário, um ‘office boy’ de luxo do governo. Faço cá o que posso para ajudar o país e saudação o presidente, qualquer que seja o regime”, disse o apresentador em 1988, para o jornal Folha de São Paulo.

A entrevista e a proximidade do Varão do Baú com o poder foram relembradas pelo jornalista Mauricio Stycer, responsável do livro “Topa Tudo por Verba: as muitas faces do empresário Silvio Santos”.

Essa enunciação, resgatada pelo jornalista, ocorreu durante o governo de José Sarney (MDB), com quem Silvio Santos também esteve. O encontro foi realizado especificamente em maio de 1985, numa era em que havia uma ameaço de revisão das concessões.

Relações com os presidentes eleitos

O apresentador também esteve com Collor antes da eleição de 1989, quando garantiu que não seria candidato, promessa descumprida no final da campanha – a tentativa de Silvio de ser candidato foi parar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Posteriormente o imbróglio todo da campanha, já com a vitória do político alagoano, Silvio recebeu a ministra da Economia, Zélia Cardoso, em seu programa no início de 1990 e chegou a manifestar base às medidas econômicas.

Pretérito o impeachment de Collor e a posse de Itamar Franco, o apresentador recebeu o logo ministro da Rancho, Fernando Henrique Cardoso, no início de 1994, em seu programa. Faltavam poucos dias para o início da circulação da novidade moeda, o real, medida que foi exaltada por Silvio na ocasião. Eleito presidente, FHC chegou a visitar as instalações do SBT, chamando-as de “uma fábrica de sonhos”.

Em seguida, chegou a vez do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que, em 2008, chegou a gravar uma mensagem para a brecha do Teleton, programa anual para recepcionar fundos para a Associação de Assistência à Gaiato Deficiente (AACD).

Um encontro entre os dois ocorreu em setembro de 2010. Duas semanas depois, seria feito o pregão da quebra do Banco Panamericano, um dos negócios do empresário. Luiz Sandoval, ex-presidente do Grupo Silvio Santos, disse à Folha de São Paulo que o motivo da visitante foi a quebra do banco e que o apresentador fora até o Planalto pedir ajuda ao presidente.

Com Dilma Rousseff (PT), o encontro foi realizado no dia do debate com Aécio Neves, no segundo vez da eleição presidencial de 2014. Silvio chegou a ser condecorado por Dilma com a Ordem do Préstimo das Comunicações.

Posteriormente o impeachment da mandatária – que, a propósito, não foi transmitido pelo SBT -, a emissora ficou empolgada com as reformas trabalhista e da Previdência no governo Michel Temer (MDB) e reproduziu teor em prol delas. Em janeiro de 2018, Temer foi recebido por Silvio Santos em seu programa.

Em novembro de 2018, durante uma noite de Teleton, Silvio falou ao telefone, no ar, com o logo presidente eleito Jair Bolsonaro. Afirmou torcer para que ele fizesse um bom procuração e se reelegesse.

“Oito anos com Bolsonaro e oito anos com [Sergio] Moro, vai ter 16 anos de um bom caminho”, disse o apresentador. Àquela profundidade, o SBT já havia exibido mensagens de cunho patriótico do tempo da ditadura militar, uma vez que o slogan “ame-o ou deixe-o”, criado nos tempos do governo Médici. A repercussão foi ruim, e a exibição foi cancelada.

Bolsonaro visitou Silvio em moradia, em São Paulo, em dezembro de 2020. Na ocasião, o apresentador disse que simpatizava com o presidente. Em tom também amistoso, o Varão do Baú entrevistou Bolsonaro em maio de 2019, mantendo a tradicional postura de carinhos aos presidentes que manteve desde a dez de 1970.

Em 2023, já semoto da televisão, Patrícia Abravanel, filha de Silvio e que assumiu sua atração aos domingos, recebeu o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) na edição que comemorou os 60 anos do “Programa Silvio Santos”.

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