
A cada 100 incêndios na América do Sul, 76 são no Brasil
Nas últimas 24 horas, o Brasil registrou 5.132 focos de incêndio, concentrando 75,9% das áreas afetadas pelo queima em toda a América do Sul, informa o Programa Queimadas, do Instituto Pátrio de Pesquisas Espaciais (Inpe). O aumento no número de focos se deu no bioma Encerrado, que ultrapassou a Amazônia nas frentes de queima e registrou 2.489 focos na segunda-feira, 9, e hoje, 10.
Uma das maiores especialistas em queima do país, a diretora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), Ane Alencar, diz que o progresso dos incêndios em grande segmento do país preocupa principalmente pela antecipação do período crítico. “A gente está numa situação muito difícil, até porque não sabe uma vez que serão os próximos meses. Não queremos que seja uma vez que foi o termo do ano pretérito, quando em outubro a situação piorou na Amazônia, principalmente em novembro e dezembro, e a chuva só começou em janeiro. Portanto, fico muito preocupada com será depois de setembro”.
Nestes primeiros dias de setembro, os focos distribuídos pelo país superam o duplo do que foi observado em 2023. Em somente dez dias são 37.492 focos registrados, enquanto que no mesmo período do ano anterior haviam sido 15.613. Para Ane Alencar, oriente ano o queima foi potencializado por uma confluência de fatores que vão desde fenômenos uma vez que o segundo ano de El Niño, seguido de La Niña, passando pelo aquecimento global e a ação humana.
“Eu acho que no Brasil, normalmente, já tivemos secas muito fortes na Amazônia, em uma segmento do Encerrado, na região mediano do país, mas pegando vários biomas ao mesmo tempo, eu acho que é uma das primeiras vezes. É quase uma tempestade perfeita, onde o clima é o motor para propagar o queima que ocorre a partir das queimadas”, diz.
Além dos incêndios que avançam sobre a Amazônia e o Pantanal, São Paulo também passa por situação sátira.
Turismo
No Encerrado, duas importantes unidades de conservação também são alcançadas pelo queima. No estado de Goiás. o Parque Pátrio da Chapada dos Veadeiros teve 10 milénio hectares atingidos pelos incêndios e em Mato Grosso, estado que lidera o número de focos, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) interditou, por tempo indeterminado, pontos turísticos da unidade concedida à iniciativa privada.
Segundo a Parquetur, administradora do uso público das duas unidades, não foi necessário obstar as atrações turísticas em Goiás, já que o incêndio ocorre em região que não afeta nem coloca em risco a superfície de visitação. “A Parquetur reforça que é importante que as visitações ao entorno continuem a ocorrer, para não gerar impactos negativos ao mercado turístico lugar.”, informou a empresa.
Ignição
Para a pesquisadora, embora a seca seja capaz de suscitar impactos na economia e no estabilidade ambiental, com isolamento de comunidades, dificuldades de transporte e mortandade de espécies, ela não é capaz de suscitar queima e a proporção de seu impacto ganha maiores dimensões pela ação humana. “Para que haja um queima, tem que ter faísca, que é essa primeira nascente de ignição, e ela é iniciada pelo ser humano, por diversos motivos. Mas os principais, eu diria, porque a gente está falando de uma região muito grande, os principais são o uso do queima para renovação de pastagem e o uso do queima na prática de conversão do solo, na prática de desmatamento”, afirma Ane.
Qualidade do ar
O cenário de incêndios em grande segmento do país faz com que os episódios críticos de poluição do ar também sejam mais frequentes e as doenças causadas pela fumaça impactem, inclusive, o sistema de saúde do país. Recentemente, o Ministério da Saúde acionou a Força Pátrio do Sistema Único de Saúde (FN-SUS) para atuar no auxílio aos estados e municípios em procura de minimizar os efeitos das queimadas na saúde humana.
Ane Alencar explica que os efeitos regionais do queima vão muito além das questões de saúde e afetam até a economia de um país. “Há um impacto para as pessoas que perdem suas matérias-primas, aquela árvore frutífera, aquela madeira que está ali na floresta; há um impacto na caça das pessoas. E também na agropecuária, uma superfície que não estava preparada para ser queimada, quando é queimada tem efeito na lavradio. Também o rebanho tem que trespassar daquele pasto queimado e ir para outro, que vai ser arrendado ou, às vezes, o rebanho até morre”.
As perdas não param por aí segundo a pesquisadora, que também aponta impactos na ciência, no meio envolvente e no bem-estar da humanidade. “Tem impactos que vão desde a perda de biodiversidade, de material genético que a gente até desconhece, a subtracção da capacidade de recuperação dessas áreas, que ficam mais suscetíveis a outros incêndios. Isso faz com que se tenha uma perda de serviço ecossistêmico, principalmente de chuva, mas também de retenção de carbono, por exemplo. Outra questão é do calor mesmo, sabemos que a floresta tem papel importante no conforto térmico”.
Conscientização
Embora em grande segmento das áreas atingidas pelos incêndios o manejo do queima esteja proibido, a pesquisadora considera que ainda é necessário melhorar a conscientização das pessoas. “Do jeito que estamos vivendo essa crise, os contingentes governamentais, sejam eles da esfera federalista, estaduais, ou municipais, não serão suficientes para sofrear o que está ocorrendo, a não ser que haja o engajamento da sociedade”, diz.