
Dificuldade em mensurar dados de diversidade compromete avanço da agenda ESG
Dificuldade em mensurar dados de flutuação compromete progressão da agenda ESG
POR BÁRBARA VETOS
A adoção de iniciativas de flutuação e inclusão continua sendo um repto para boa segmento das empresas. Uma pesquisa realizada pela plataforma to.gather mostrou que somente 42,6% das companhias possuem uma risco de investimento dedicada às ações de flutuação e 58,1% tiveram pouquíssimo ou nenhum progressão em inclusão nos últimos dois anos. Ou por outra, embora 81,3% afirmem coletar dados sobre flutuação interna, somente 45,5% realizam censos de flutuação, considerados o meio mais adequado para mensuração.
De tratado com Erika Vaz, co-fundadora e CEO da to.gather
, existe uma relação paradoxal entre ambas as questões. “Muitas vezes, as organizações não conseguem fazer a mensuração quando falamos de flutuação. Consequentemente, também enfrentam dificuldades em fazer o investimento.” Por mais que haja um impacto real, ações ESG podem ser descontinuadas por falta de comprovação de resultados.
Em entrevista ao ESG Insights, Vaz aponta quais grupos são mais sub-representados nas empresas, uma vez que a falta de dados pode comprometer a estratégia ESG, a dificuldade em trabalhar a flutuação no contextura corporativo e as alternativas para as companhias se estruturarem frente à crescente exigência de prestação de contas. Confira.
ESG Insights – Quais são os principais desafios na mensuração de dados por segmento das empresas?
Erika Vaz –
A melhor forma de mensurarmos a flutuação ou, pelo menos, fazer esse mapeamento inicial, seria pela autodeclaração. Ou seja, um levantamento em que as pessoas falem uma vez que se identificam em raça, gênero, orientação sexual, e assim por diante.
Pelo que vimos na pesquisa, só 45% das empresas realmente usam essa forma para mensurar, porque elas acabam se limitando a dados de recepção e se baseiam naquilo para entender o seu cenário de flutuação. O problema é que no documento de recepção você não tem todas as informações. Na verdade, muitas vezes, é só o sexo ou até a raça.
E por que as empresas não fazem essa pesquisa de autodeclaração? Porque esses dados são sensíveis pela LGPD [Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais] e, normalmente, as companhias pensam muito muito antes de colocar esse projeto no ar por envolver alguns riscos.
Esse tipo de pesquisa de autodeclaração normalmente é anônimo, justamente para prometer ainda mais segurança no processo. Isso pode ser feito de forma interna, com o time de RH, ou mesmo contratar uma consultoria. O problema é que, por ser anônima, simples e pontual, não se conecta com nenhuma outra informação do RH. Não tem uma vez que saber, por exemplo, se as pessoas que foram mapeadas no início já saíram da empresa ou até se foram promovidas e mudaram de incumbência.
A empresa precisa ter uma visibilidade maior desses públicos de flutuação dentro do quadro funcional, mas fazer um comitiva conforme vai contratando e desligando funcionários.
Lembrando que eu estou falando só de 45% das empresas, porque a maioria não se arrisca a fazer esse processo dentro de lar por ser sensível, ou ainda por conta da maturidade do tema internamente.
Muitas vezes, encontramos cenários de negócios que estão dificuldades em falar de flutuação e sentem que trazer o recenseamento seria um passo mais alcantilado. Seria um tanto para se fazer lá na frente, porque as pessoas não estão maduras o suficiente para isso no momento.
ESG Insights – Quais grupos são mais sub-representados e quais recebem mais atenção e direcionamento das iniciativas de flutuação?
Erika Vaz –
As pautas que mais avançaram, ainda que pouco, foram de gênero e raça. A questão de pessoas com deficiência também, só que percebemos que esse movimento está muito mais relacionado à Lei de Cotas. As empresas seguem o que a lei determina e se limitam a isso. São poucas as empresas que estão realmente comprometidas com essa tarifa para além da legislação, fazendo um movimento mais profundo e inclusivo.
“A questão LGBT parece ser vista de modo mais sensível, por isso existe uma dificuldade de adentrar no tema e falar desse público internamente”
Os grupos que estão em menor foco são o público LGBT e público com mais de 50 anos. No primeiro, se eu ainda fizer o recorte de pessoas trans isso fica mais crítico. O trajo de pessoas mais velhas também serem deixadas de lado é surpreendente, principalmente considerando o cenário de envelhecimento populacional. É um tema que precisa ser mais trabalho se quisermos olhar para a sustentabilidade do negócio uma vez que um todo.
Existem outros grupos pouco representados, uma vez que pessoas neurodivergentes, refugiados, que também acabam sendo minorias.
No caso de gênero e raça, percebemos que existe uma aceitabilidade um pouco melhor, principalmente com os colaboradores. Acaba sendo um território em que as empresas ganham mais espaço e se sentem mais confiantes em trabalhar, ainda que em algumas iniciativas elas não queiram se aprofundar. Mas flutuação é muito mais do que somente fazer ações de informação.
A questão LGBT parece ser vista de modo mais sensível, por isso existe uma dificuldade de adentrar no tema e falar desse público internamente ou com as lideranças. Sabemos que isso está muito ligado ao preconceito e à discriminação e isso, inclusive, só reforça uma vez que essa tarifa deveria estar em curso dentro das empresas.
ESG Insights – Por que ainda é tão difícil falar sobre flutuação internamente nas empresas?
Erika Vaz –
Vemos um cenário de falta de dados que comprovem o real impacto de flutuação no negócio. Muitas vezes, as empresas fazem ações mais superficiais, normalmente ações que não estão ligadas a uma estratégia maior e que, consequentemente, não têm um impacto que possa ser muito muito mensurado e demonstrado. Só que isso não ajuda na resguardo junto às altas lideranças.
“A liderança precisa fazer uma aposta no início para que consigamos, de trajo, ter retornos e impactos relevantes para empresa”
No final, quem está primeiro da organização quer que todo esse investimento em flutuação traga qualquer impacto, seja financeiro, seja de cultura, seja de marca. Tem que possuir qualquer retorno e, muitas vezes, as organizações não conseguem mensurar isso quando falamos de flutuação. Consequentemente, também enfrentam dificuldades em fazer o investimento.
Acaba virando um paradoxo: você precisa provar para a subida liderança os impactos de flutuação para ela investir, só que você também precisa de investimento para fazer ações que vão impactar em flutuação.
A liderança precisa fazer uma aposta no início para que consigamos, de trajo, ter retornos e impactos relevantes para empresa. Mas elas têm enfrentado dificuldades em provar isso na prática.
Hoje, as empresas estão quase meio a meio entre as que investem e as que não, mas a gente percebe que eles [RH] estão precisando reportar essas contas, trazer essa justificativa de uma forma mais estruturada. Elas precisam olhar os dados não mais de uma forma pontual, mas uma vez que segmento da estratégia de flutuação.
ESG Insights – Em uma estudo universal do cenário, você acredita que o investimento em flutuação vem crescendo?
Erika Vaz –
Sim, mas um pouco mais lento do que já foi, por exemplo, em 2021-22, em que a tarifa teve um boom
mais caloroso. O investimento está sendo mais cordato.
Na pesquisa, perguntamos o que as empresas estavam esperando para os próximos anos sobre essa questão de investimento. Só 35,3% disseram que esperavam um aumento de trajo no investimento em flutuação, e 48,1% disseram que vai permanecer no mesmo padrão sem muitas mudanças.
Uma redução muito provavelmente não vai ter, mas também não vamos ter uma baita escalada. Sabemos de algumas empresas que até deram termo a suas iniciativas pela dificuldade em conseguir mensurar o impacto.
“As lideranças precisam ter a intenção de gerar uma mudança. […] Há um impacto para a sociedade e para o país que é muito maior do que só o quadradinho da sua empresa”
E ele existe, o verba não está sendo esperdiçado de forma alguma, mas precisamos visualizar isso. Precisamos continuar investindo em flutuação para a sociedade, mas também para empresa.
Nesse sentido, é importante falar também sobre intencionalidade. As lideranças precisam ter a intenção de gerar uma mudança, porque quando a intencionalidade existe, ela não vai permanecer só olhando para números. Ela vai entender que há um impacto para a sociedade e para o país que é muito maior do que só o quadradinho da sua empresa.
Quando esse conhecimento existe, o investimento em tarifa sociais e em iniciativas vai sobrevir, porque a liderança sabe que é importante manter e até expandir.
ESG Insights – A geração de comitês de flutuação ou mesmo a contratação de profissionais especializados no tópico podem ajudar nessa comprovação para as lideranças de que o investimento tem propósito?
Erika Vaz –
Esses profissionais já têm uma bagagem e uma expertise do tema e são capazes de ajudar as empresas nessa mensuração. Isso não é uma tarefa fácil. Pluralidade é um impacto de pessoas e cultura de médio longo e prazo.
Não é um tanto que se faz do dia para a noite. É multíplice. As empresas precisam de ajuda e esses profissionais ou até consultorias seriam um bom caminho para conseguir prosseguir nesse vista.
Provavelmente, os comitês não vão ser os principais responsáveis por toda a mensuração, mas podem ser responsáveis por tomar as melhores decisões a partir dela ou procurar por profissionais e por esse esteio para que os dados, no final, estejam em mãos.
ESG Insights – Uma das grandes dificuldades das empresas está justamente em ter um controle sobre o restante da masmorra de valor. Nesse caso, uma vez que funciona a mensuração? É mais difícil?
Erika Vaz –
É superdifícil e ainda mais multíplice, porque se a empresa já tem uma dificuldade em mensurar com seus próprios funcionários, imagina com os funcionários ou todo o cenário de outra empresa.
Existem algumas organizações – aquelas que são mais comprometidas com a tarifa – que exigem dados de flutuação durante os processos de concorrência, licitação e afins. Algumas se movimentam no sentido de, pelo menos no início da relação mercantil, entender o que a outra companhia tem de políticas de flutuação e quais seus resultados.
Mas ainda é uma minoria. Acreditamos que é um movimento que vai inaugurar a se expandir, até porque recentemente a União Europeia aprovou uma novidade lei que exige que as empresas comecem também a mapear a flutuação da sua masmorra de valor.
E não importa se a empresa está só atendendo na União Europeia ou não. Inclusive, se empresas brasileiras estiverem atuando por lá, também serão impactadas. Vendo essa movimentação e olhando para masmorra de valor lá fora faz a gente prever que talvez o tema comece a esquentar mais por cá.
ESG Insights – Você acredita que determinações uma vez que as da Percentagem de Valores Mobiliários (CVM) podem aligeirar ainda mais esse processo de mensuração e estratégias ESG por segmento das empresas?
Erika Vaz –
Quando a gente vê grandes órgãos uma vez que a própria CVM fazendo exigências relacionadas à flutuação, isso sem incerteza tira algumas empresas da sua zona de conforto.
“Para algumas empresas que estão hoje listadas em bolsa, se não fosse o movimento da CVM, talvez ainda não houvesse uma mensuração real de flutuação”
Acredito que, para algumas empresas que estão hoje listadas em bolsa, se não fosse o movimento da CVM, talvez ainda não houvesse uma mensuração real de flutuação. Se olharmos os formulários de referência que ficam públicos no site da CVM, veremos que algumas grandes empresas não têm boa segmento dos dados exigidos hoje.
É ótimo quando empresas e governos passam a se posicionar e fazer essas exigências, porque a gente vê que agora todo mundo vai inaugurar a se alinhar com uma novidade visão para dados de flutuação.
A formalidade para 2026 deve aligeirar o desenvolvimento de maturidade das empresas na tarifa e, apesar de restringido dentro das empresas listadas, pode ser um acelerador também para a mensuração de impacto de flutuação.
As empresas agora vão ter que trazer essa mensuração no mínimo anualmente. Isso pode estribar em todo o repto sobre os impactos serem mais tangíveis e a empresa conseguir visualizar melhor uma vez que está seu cenário hoje.
O esteio da B3 também tem sido importante, com a geração do índice do IDiversa para provar resultado financeiro daquelas empresas que performam melhor em flutuação.
ESG Insights – Você acredita que essa dificuldade de mensuração de dados e divulgação de relatórios mais robustos pode terminar mascarando os resultados e impactos de práticas de flutuação?
Erika Vaz –
Quando não se tem dados ou eles estão subnotificados, sabemos que isso afeta diretamente na capacidade da empresa continuar desenvolvendo esse tipo de ação.
“A velocidade com que ela [a pauta] avança no nível de exigência de dados não é a mesma velocidade em que as empresas são capazes de mensurar e reportar”
A flutuação tinha que ser uma das pautas mais vivas e investidas pelo RH, só que a velocidade com que ela avança no nível de exigência de dados não é a mesma velocidade em que as empresas são capazes de mensurar e reportar.
Outro cenário que temos é no caso de organizações que não conseguem fazer isso de uma forma correta e às vezes você acabam apresentando um oferecido que não necessariamente se verifica. Isso pode prejudicar muito a tarifa.
Falando de impacto de flutuação em inovação e cultura, você não pode simplesmente pegar um período em que a empresa não performou muito financeiramente e vincular aquilo às pautas de flutuação. É completamente equivocado fazer essa associação.
Tem muitas empresas, por exemplo, que não conseguem mapear de forma profunda a orientação sexual das pessoas. Se em uma pesquisa 30% ou 40% disserem que preferem não responder sobre o tema, não é correto você declarar que tem pouquíssimas pessoas LGBT na empresa e, por isso, não precisa focar nessa tarifa. Já está subnotificado, o seu oferecido não é o mais confiável.
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