
Indústrias contra as cordas entre ajuste e recessão na Argentina
Trabalhador inspeciona rolos de papel higiênico em uma traço de produção da fábrica Rosato de Berazategui, em Buenos Aires, no dia 15 de abril de 2024
LUIS ROBAYO
“Sem consumo começamos a morrer aos poucos”, resume Gustavo Ávalos, possuidor de uma fábrica de tintas industriais em Avellaneda, com as máquinas paradas devido à queda nas vendas na Argentina enquanto os custos não param de aumentar.
A situação deste empresário da periferia sudeste de Buenos Aires se repete no vasto cinturão industrial da cidade, onde a queda de vendas é agravada pelo aumento de 500% nas contas de luz e gás em meio a uma inflação anual de 290%.
A atividade econômica no país caiu por quatro meses consecutivos até fevereiro, segundo os últimos dados oficiais disponíveis.
Assim uma vez que a Tintas Opalo, outras pequenas e médias empresas (PME) estão passando por dificuldades diante da desregulamentação econômica e da lhaneza das importações promovidas pelo governo do presidente ultraliberal Javier Milei.
“Algumas não conseguem remunerar salários, outras tampouco alugueis. O quadro é desanimador. Posso sustentar por um ano, depois veremos”, disse nascente empresário, que acredita que ainda não se viu o “pior”, considerando que “as pessoas têm poupanças”.
Suas vendas caíram 70% em dezembro, queda que foi reduzida para 40% em março.
Os poucos pedidos dispensam o uso das novas embaladoras automáticas que comprou em dezembro e que estão encalhadas na fábrica.
“Elas embalam muro de 8 milénio potes por dia. Mas voltamos a embalar manualmente para não suspender ninguém”, diz Ávalos.
Segundo Adrián Mercado, da principal empresa de leilões de mesmo nome, a taxação sobre máquinas industriais aumentou de forma significativa.
“Ganhamos uma dúzia por dia para as PME que se desfazem de maquinário para enfrentar a tempestade. Não há compradores, acabam liquidadas uma vez que sucata”, contou.
O Indec informou que a queda da atividade foi de 3,2% em fevereiro em relação ao mesmo mês de 2023. A queda atingiu principalmente os setores industriais, sobretudo de manufatura e construção.
Em março, a confederação que reúne os médios empresários, CAME, estimou que o colapso da produção industrial atingiu 11,9% em relação ao mesmo período do ano pretérito. No primeiro trimestre, os principais itens industriais caíram 20% em relação ao trimestre anterior.
“As PME não veem um piso no limitado prazo”, declarou a CAME. Tampouco as grandes indústrias.
Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), a economia argentina contrairá 2,8% nascente ano e recuperará 5% em 2025.
– “Não há moeda” –
Em Caseros, na periferia oeste de Buenos Aires, Dulcypas faz biscoitos utilizando metade de uma máquina. Duas linhas de produção de sua fábrica estão paradas.
Os ganhos são sustentados pelas vendas diretas e exportações para o Uruguai.
“Temos uma capacidade ociosa de 50%. Estamos vivendo um ajuste significativo. Há pouco moeda, os preços sobem muito e depois há o consumo que é separado. Mas os biscoitos vendem muito muito porque são baratos; os muffins, mais caros, nem tanto”, explicou Fernando Martínez, proprietário da empresa.
Para manter a lucratividade, a companhia precisou dispensar funcionários, reduzir salários e os volumes de produção.
Segundo Daniel Rosato, proprietário de uma fábrica de papel e presidente do Sindicato Industrial de Berazategui, periferia sul de Buenos Aires, “não há uma política industrial”.
“Os insumos aumentaram em dólares. Em conferência com 2023, perderam-se 600 PME de produção industrial que exportavam”, declarou, ressaltando um aumento da informalidade no país, o que gera “menos receitas para o Estado”.
Para Alejandro Bartolini, possuidor da Metalcrom, que produz bombas de petróleo, a saída é melhorar a competitividade para as exportações.
“A única maneira é competir. Não acreditamos em mercados fechados, tampouco que uma lhaneza indiscriminada possa nos levar ao sucesso porque o trabalho e o capital serão perdidos se o mercado extrínseco não for regulamentado, uma vez que acontece até mesmo nos países mais liberais”, disse.
“Em nenhuma das medidas Milei se referiu às PME, à produção, ao trabalho; a única coisa que o ouvimos expor é sobre o ajuste, déficit zero, não há moeda”, criticou o empresário.