Governo de Cuba lança ofensiva para regular setor privado

Luis JIMENEZ

Foto publicada pela Sucursal Cubana de Notícias (ACN) mostra o primeiro-ministro cubano, Manuel Marrero, participando de uma sessão ordinária do Parlamento em Havana, em 17 julho de 2024

Luis JIMENEZ

Risca-dura contra a “depravação” e a “evasão fiscal”: quase três anos depois de ter autorizado as pequenas e médias empresas privadas, o governo cubano lançou nesta quarta-feira (17) uma ofensiva para regular o setor que abalou uma economia em crise profunda e ao qual acusa de gerar “tendências negativas”.

“Não estamos cá para fechar [as empresas privadas]”, mas “temos que reordenar”, assinalou o primeiro-ministro Manuel Marrero, ao apresentar um relatório durante uma sessão do Parlamento que vai se estender até o sábado.

Com uma inflação galopante, a desvalorização do peso cubano no mercado informal, baixos níveis de produtividade, um déficit fiscal abissal (22% do PIB), escassez e falta de liquidez, a ilhota comunista, enfraquecida pelos efeitos da pandemia e o recrudescimento do embargo de Washington, está mergulhada em sua pior crise em 30 anos.

Em uma tentativa de minuir a escassez, o governo autorizou em 2021, pela primeira vez em 60 anos, a operação de empresas privadas em setores definidos, uma vez que o turismo, a construção e o provimento de mantimentos.

Mas, a emergência do setor privado em um quadro escravizado em 80% por empresas estatais gerou “distorções” e “tendências negativas”, segundo o governo, justo quando fracassava uma reforma monetária destinada a dar impulso à economia.

Afeito a captar a maior segmento das divisas que entravam o país, o Estado se deparou repentinamente com uma premência desesperada por moedas estrangeiras, tendo que competir com esses novos atores.

As importações do setor privado, avaliadas pelo governo em 1,3 milhão de dólares em 2023 (R$ 7,1 milhões, na cotação atual), provocou “uma lesma incontrolável de demanda por divisas no país”, favorecendo o desenvolvimento de um mercado ilícito, explicou Marrero.

O primeiro-ministro acusou algumas dessas empresas de participação no “mercado ilícito de divisas”. “Chegaram inclusive a oferecer bens e serviços no território pátrio em moedas estrangeiras”, apontou.

Pelo menos quatro moedas – o peso cubano, o dólar, o euro e o MLC (lema lugar eletrônica equivalente ao dólar) – coexistem na ilhota de 11 milhões de habitantes, onde também há três taxas de câmbio, duas oficiais e uma informal.

– ‘Ordem e disciplina’ –

Em sua participação de mais de duas horas, o primeiro-ministro reconheceu que “faltou previsão” às autoridades. Mas “também não se cumpriram coisas que estavam claras”, acrescentou, ao ressaltar a premência de “restabelecer a ordem e a disciplina” no sistema econômico.

Na terça-feira, o presidente Miguel Díaz-Canel criticou a “depravação” e os “altos níveis de evasão fiscal” que pesam sobre uma economia também prejudicada pela baixa produtividade e pela burocracia.

Segundo Marrero, a evasão fiscal por segmento dos atores privados em material de impostos sobre as vendas alcançou “50 bilhões de pesos cubanos entre o início de 2023 e abril de 2024”. “É um terço do déficit orçamentário” do país, insistiu, sem explicar a taxa de câmbio que utilizou para o operação.

Entre as medidas anunciadas estão o aumento dos controles fiscais, o reforço da fiscalização, o fechamento de empresas que subnotificam, o reforço dos sistemas de pagamentos eletrônicos e a certificação da legitimidade dos fundos.

Em relação à queda do peso cubano perante o dólar, que chegou a ser cotado nesta quarta-feira em 308 pesos por unidade no mercado ilícito, contra 120 pesos no formal, o governo descartou uma novidade desvalorização, mas deixou clara a sua intenção de “recolher o excesso em circulação”.

O montante totalidade de pesos “circulando nas ruas neste momento é de 400 bilhões” e “está concentrado em 10% da população”, detalhou Marrero. Ou por outra, ele destacou que “poderia superar, no termo do ano […], os 600 bilhões”.

Confrontados com uma poderoso inflação (70% em 2021, 39% em 2022, 30% em 2023), a maioria dos cubanos viu seu poder aquisitivo despencar, enquanto algumas empresas privadas enchem suas prateleiras com produtos importados inacessíveis, agravando as desigualdades cada vez mais aparentes.

O primeiro-ministro prometeu uma “novidade lei de empresas” em setembro, e destacou que, na economia planificada do país, 20% da força de trabalho atua no setor informal.

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