Samarco e Vale condenadas por publicidade sobre Mariana

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Samarco e Vale condenadas por publicidade sobre Mariana

A mineradora Samarco e suas duas acionistas – Vale e BHP Billiton – foram condenadas pela Justiça Federalista por violações envolvendo uma campanha publicitária sobre as medidas reparatórias da tragédia ocorrida na bacia do Rio Guloseima, na região de Mariana (MG). A pena também atinge a Instauração Renova, entidade que foi criada para gerir todas ações de reparação de danos. Juntas elas deverão remunerar R$ 56 milhões por danos materiais e morais. Ainda cabe recurso.

“É evidente o meandro de finalidade da instauração que se prestou a uma campanha publicitária e de marketing para geração de uma narrativa fantasiosa em prol da própria instauração. A situação, além de provar o desrespeito da Renova ao seu próprio regimento, demonstra claramente uma falta de reverência em relação às vítimas e à sociedade brasileira”, registra a decisão assinada pelo juiz Vinícius Cobucci.

A tragédia ocorreu em novembro de 2015. O rompimento de uma barragem da Samarco no município de Mariana, em Minas Gerais, liberou uma avalanche de rejeitos, causando 19 mortes e gerando impactos para populações de dezenas de cidades mineiras e capixabas ao longo da bacia do Rio Guloseima.

Poucos meses em seguida o incidente, as mineradoras, a União e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo firmaram um tratado de reparação que ficou sabido com Termo de Transação e Ajuste de Conduta (TTAC). Com base nele, foi criada a Instauração Renova. Ela assumiu a gestão de mais de 40 programas, cabendo às mineradoras o custeio de todas as medidas.

Porém, passados mais de oito anos, a atuação da entidade é mira de diversos questionamentos judiciais por segmento dos atingidos, do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e do Ministério Público Federalista (MPF). Há discussões envolvendo desde a lentidão para a epílogo das obras de reconstrução dos distritos arrasados na tragédia até os valores indenizatórios.

A falta de autonomia da Instauração Renova perante as mineradoras é outra questão contestada pelo MPMG, pelo MPF, pela Defensoria Pública da União (DPU) e pelas Defensorias Públicas de Minas Gerais e do Espírito Santo. Juntas, foram também as quatro instituições de Justiça que apresentaram, em uma ação social pública movida no ano de 2021, a denúncia de que havia “propaganda enganosa” no material publicitário distribuído pela entidade.

Elas reuniram conteúdos que teriam “informações imprecisas, dúbias, incompletas ou equivocadas” e que estariam “noticiando o restabelecimento de uma normalidade inexistente, em temas fundamentais para a população, uma vez que a qualidade da chuva e do envolvente aquático, recuperação de nascentes e bioengenharia, recuperação econômica, indenização, reassentamento e concentração de rejeitos”. A ação também mencionou a existência de estudos científicos, perícias e trabalhos de campo realizados por especialistas que demonstrariam o contrário do que apregoam os materiais publicizados pela Instauração Renova.

“No período de pouco mais de um mês [6 de setembro a 11 de outubro de 2020], a Instauração despendeu R$ 17,4 milhões com um único contrato de publicidade, de quem objetivo foi tão somente o de promover uma imagem positiva da entidade e de suas mantenedoras.

Ao todo, foram 861 inserções em TVs e 756 em emissoras de rádio, sem incluir o material divulgado em veículos impressos e portais de notícias”, afirmaram na era as instituições de Justiça. Elas avaliaram que as inserções publicitárias não têm os atingidos uma vez que verdadeiro público-alvo, mas investidores e a sociedade em universal.

“Tais valores adquirem peculiar relevância quando se constata que eles foram gastos em detrimento de diversos programas cuja realização é a única razão da existência da Renova. Prova disso é que os R$ 17,4 milhões gastos com a campanha veiculada em 2020 são superiores ao valor individualmente gasto em 13 dos 42 programas previstos no tratado que criou a entidade, conforme dados apresentados no site
da própria instauração”, acrescentaram.

Pena

Embora divulgada nessa terça-feira (6) pelo MPF, a decisão foi assinada há duas semanas. Conforme a pena, além de remunerar R$ 56 milhões por danos materiais e morais, as mineradoras e a Instauração Renova deverão realizar uma contrapropaganda, com novas peças trazendo esclarecimentos sobre tópicos presentes nas publicidades que foram considerados incorretos, inverídicos ou imprecisos.

A decisão observa que uma das obrigações da Instauração Renova previstas no TTAC é a veiculação de informações de forma transparente, clara e objetiva. Segundo o juiz Vinícius Cobucci, as peças veiculadas pela entidade tentam romantizar a reparação, são destinadas à autopromoção, relativizam o sofrimento dos atingidos.

Ele considerou que houve “verdadeira campanha de desinformação, com o intuito de minimizar o impacto do rompimento da barragem” e avaliou que a “tentativa de controle da narrativa para gerar uma campanha orquestrada de desinformação não é exclusivamente obsceno, uma vez que ilícito”. Cobucci também lamentou a postura da Instauração Renova de sempre responsabilizar terceiros por atrasos e outros problemas. “Não há autocrítica ou humildade para consentir que a instauração erra”.

Procurada pela Escritório Brasil, a Instauração Renova afirmou que atua nos limites do TTAC e que apresentará recurso contra a referida decisão. A Samarco informou que se manifestará sobre o tópico exclusivamente nos autos do processo. A Vale e a BHP Billiton não se posicionaram.

O insatisfação com o processo reparatório levou os governos, as mineradoras e as instituições de Justiça a iniciarem em 2022 uma negociação para um tratado de repactuação, capaz de mostrar solução para mais de 85 milénio processos atualmente em tramitação. Até o momento, no entanto, não houve sucesso devido à falta de consenso em torno dos valores. A oferta das mineradoras têm sido considerada insuficiente pelas demais partes.

Foto: Antônio Cruz/Escritório Brasil

Tragédia em Mariana (MG): publicidade enganosa dos esforços de reparação e reconstrução

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