ENTREVISTA: Novo rali é improvável na China, mas tendência segue de alta

Acompanhando de perto a economia chinesa desde 2008, Fabiana D’Atri já viu vários ciclos: da euforia com o desenvolvimento e o boom do mercado imobiliário à desaceleração mais recente que afeta toda a economia mundial.

Na novidade rodada de estímulos anunciada nas últimas semanas, a economista da Bradesco Asset vê uma combinação poderosa. É o que o mercado vem chamando de “bazuca chinesa”: ações de política monetária, para o setor imobiliário e acionário, visando estimular o desenvolvimento e a crédito das famílias, que vinha sendo o grande calcanhar de Aquiles da segunda maior economia do mundo.

“São medidas de limitado prazo”, afirma, alertando, no entanto, que os anúncios ainda não pararam e os estímulos no front fiscal que vem sendo sinalizados podem ajudar a manter o sentimento vivo.

Ela ainda recomenda cautela e acredita que o rali de 20% na bolsa chinesa, uma vez que o visto na última semana, é improvável. “Mas entregar? Acho que não. A tendência continua favorável.”

Uma das maiores novidades nesse novo ciclo de estímulos, além da abrangência, é o foco no consumo interno e não na expansão da capacidade industrial, diz D’Atri.

Ela esteve no país no primórdio deste ano e já via um esgotamento do protótipo puro e simples de expansão da oferta, visando o mercado extrínseco.

Nesse sentido, as medidas voltadas para o segmento imobiliário, com redução das taxas de financiamento e redução para restrição de compra de novos imóveis, são o grande destaque.

A seguir, os principais trechos da conversa:

O quanto as medidas que vem sendo anunciadas são suficientes para estimular um desenvolvimento mais sustentado?

Mais do que o pacote de medidas, é uma combinação bastante relevante. O que o governo chinês vinha adotando eram medidas espaçadas. Logo anunciar medidas de política monetária, de política fiscal, ações voltadas para o setor imobiliário e para o mercado acionário, é dissemelhante do que já vimos.

O objetivo final é resgatar a crédito e a renda das famílias e das empresas. Uma das medidas com mais relevância foi a redução da taxa do financiamento imobiliário, inclusive para o estoque. Isso acaba liberando renda para as famílias, à medida que elas refinanciam a uma taxa mais baixa.

Na minha visão, as medidas não acabaram, foram algumas rodadas. Na quinta-feira, 26, houve um pregão de possíveis instrumentos e volumes de políticas fiscais. Isso ainda não tem um detalhamento, sobre qual instrumento vai ser usado, se vai ser o governo medial ou sítio, o tamanho dessas linhas de liquidez, se vai possuir aporte no capital dos bancos, mas ainda há notícias por vir.

Na viradela do final de semana, houve um sinal importante na redução das restrições na compra de imóveis. Foi em uma cidade grande, em Guangzhou, e a expectativa é que outras cidades também façam.

Na China, há uma série de restrições, por exemplo, se você for financiar um segundo imóvel, tem que dar uma ingresso maior. Na hora que essas restrições são derrubadas, as oportunidades para comprar um imóvel crescem. Logo, sim, essas medidas são diferentes do que era observado, tanto na abrangência, quanto no objetivo final.

As ações voltadas para o mercado acionário também são uma forma de resgatar a crédito, porque secção do patrimônio das famílias está no mercado acionário, e na hora que a bolsa sobe, essa percepção de riqueza melhora.

Minha avaliação é que, por ora, o sinal é positivo e tende, pelo menos, vedar a desaceleração que vinha acontecendo.

Ele é suficiente para uma novidade rodada de desenvolvimento?

Antes de melhorar, precisa parar de piorar. É uma pré-condição para que essas medidas comecem a surtir efeito. No limite, as famílias vão gastar aquilo que podiam e vão deixar de poupar. Só isso daria uma possibilidade de desenvolvimento em torno de 0,50 ponto percentual do PIB. E aí você prepara as condições para outras medidas mais estruturais que possam ter um efeito de médio prazo.

A pergunta originário nesse momento é se as medidas foram de limitado ou médio prazo. São medidas de limitado prazo. Tem notícia que ainda está para vir, o que pode ajudar a manter esse sentimento favorável vivo.

Quanto era sua projeção de desenvolvimento do PIB antes e agora? Você acha que vai ser provável saber a meta de 5% para 2024?

Nossas projeções são de um desenvolvimento de 4,6%, em 2024, e 4,2% para 2025. Quando eu disse que tem um potencial de melhora, é ao longo do tempo.

Se os dados começarem a mostrar uma reação positiva, tanto de consumo, quanto de vendas e lançamentos de imóveis, aí eu incorporo no cenário. Mas agora acho muito precipitado.

Em universal, o mercado financeiro antecipa os movimentos, portanto os preços dos ativos tendem a reagir antemão, mas me parece que a cautela é necessária. Temos que esperar, e não uma semana, alguns meses, para reavaliar as projeções tanto para esse ano quanto para o ano que vem. Se as medidas surtirem efeitos, se a crédito das famílias e das empresas voltar a se restaurar, é provável que o desenvolvimento deste ano seja mais próximo da meta de 5%.

E em 2025?

É o que é mais importante olhar: as projeções dos analistas estavam convergindo para números próximos a 4%, que é muito distante de 5%. Não sabemos a meta que vai ser estabelecida para o ano que vem, mas dificilmente o governo faria um ajuste para um número tão subordinado ao deste ano. Me parece provável manter a meta de desenvolvimento para 5% em 2025. Por isso que essas medidas têm que ter um alcance mais expandido, não é resolver o problema deste ano. O governo está tentando preparar as condições para que esse desenvolvimento seja mais sustentável.

O foco, portanto, é o consumo. E do lado da oferta?

A China, nos últimos anos, investiu muito em uma capacidade produtiva industrial para atender seu mercado interno e extrínseco. E em alguns setores, aparentemente, não têm nem demanda interna ou externa suficiente para dar conta dessa capacidade produtiva. Sege elétrico é um exemplo.

O que nós observamos em termos de preços, que é uma deflação, é um desbalanceamento de oferta e demanda.

A grande questão hoje da China não é uma vez que investir mais – e talvez essa tenha sido uma das grandes mudanças nesses anúncios da semana passada. Porque o governo chinês vinha insistindo que a indústria era o que determinaria o desenvolvimento, esse seria o guia. Mas a demanda das famílias foi ficando para trás. A China até vem tendo um desenvolvimento das exportações, mas isso não é o suficiente para balancear.

Logo o que se observava era a indústria muito muito, puxada pelas exportações, mas o consumo detrás. Essas medidas, uma vez que falei, tendem a propiciar a crédito das famílias, para que, dada a renda e as condições de trabalho, elas possam gastar aquilo que é comportável.

O que se observa ao longo dos últimos anos na China é que a poupança das famílias começou a desbalancear o consumo. A poupança cresceu, enquanto a demanda por empréstimos caiu e o consumo caíram.

Por isso que os mercados, os preços dos ativos, têm reagido de maneira bastante positiva a essas medidas. Eles mudam esse foco da política econômica, de ser menos oferta, menos indústria, para ser mais renda.

Tem qualquer oferecido crucial para permanecer de olho sobre o real impacto dessas medidas sobre o consumo?

Seguir o oferecido de lançamento e vendas de imóveis – que conseguimos fazer semanalmente – me parece que é um bom indicador para ver se as famílias voltaram a comprar. Outro indicador que me parece importante é o desempenho dos mercados acionários. O quanto essa subida da bolsa, que ultrapassou 20% em uma semana, se sustenta. Esperar outra pernada dessa? Me parece bom ter cautela.

Outro indicador é a poupança e o volume de empréstimos.

Simples, muito desses dados, dificilmente você vai ver uma grande diferença em um mês. Logo o governo vai monitorar o que seria a temperatura da crédito, por meio da bolsa e das vendas de imóveis.

Mas me parece necessário julgar um trimestre, também uma vez que as vendas do varejo se comportaram ou se os dados de crédito reagiram. Leva qualquer tempo, oferecido que você quer movimentar a crédito que estava travada.

O próprio oferecido de crédito das famílias é mensal, portanto dá para ver se teve diferença. Dentro desse indicador, podemos transfixar o componente de trabalho, se as famílias estão com pavor de perder o trabalho (que vinha desacelerando bastante), o componente de renda, de consumo. Até o preço de commodities vai incorporar esse sentimento – e os dados de economia, que estamos monitorando.

Sobre oportunidade, esse rally da semana passada na bolsa, em sua visão, pode permanecer? É uma oportunidade para o investidor estrangeiro entrar agora?

Uma pergunta que as pessoas têm que fazer é: qual veículo, qual mercado, qual preço de ativo que eu posso ter a oportunidade de velejar nesse cenário? Porquê é um movimento mais macro, quanto mais extenso for o mercado, melhor. Por exemplo, a bolsa consegue conquistar o preço das commodities.

Logo eu posso apostar que o preço do cobre, do minério de ferro vai subir. Ou eu vou comprar a bolsa chinesa, ou uma bolsa correlata, ou uma moeda que tenha uma exposição à economia chinesa e possa conquistar esse movimento.

Simples, depois das bolsas terem oferecido um salto, a pergunta é se fica, se tem outro progressão ou se devolve. Outro rally, uma vez que esse, não temos evidência ainda. Mas entregar? Acho que não. A tendência continua favorável.

Porquê o movimento é voltado ao consumo, os ativos ligados a ele parecem que podem ter um desempenho mais favorável, quando eu comparo as commodities que têm exposição ao setor imobiliário. Esse setor vai se restaurar, mas não é mais um instrumento para a economia chinesa. Esse ponto é importante.

As medidas anunciadas não mudam alguns parâmetros que o governo entende para China, o desenvolvimento ainda vai ser puxado pela indústria, pelos investimentos em tecnologia. O setor imobiliário não voltará a ser o que era antes. O governo fala sempre que morada é para morar e não especular.

Mas, nesse sentido, pode-se desenvolver outros mecanismos para investimento chinês e que indiretamente pode beneficiar os investimentos estrangeiros.

O direcional da bolsa chinesa é uma escolha, ou de bolsas que estejam muito ligadas à China uma vez que Hong Kong, que acaba sendo o espelho da bolsa chinesa. Outra opção são as commodities, uma vez que o minério de ferro, que foi sovar quase US$ 110.

E as moedas de países que têm exposição da China, dentre eles o real e moedas da Austrália, da Novidade Zelândia, da África do Sul e do Chile. Países que exportam muito para a China tendem a ter um desempenho positivo. E, evidente, os preços dos ativos uma vez que um todo no mundo acabam tendo esse mercê, pelo menos de não ter um risco negativo vindo da China.

Mostrar mais

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo
Fechar

Adblock detectado

Por favor, considere apoiar-nos, desativando o seu bloqueador de anúncios